
Gestão e investimento nos esportes: desafios à vista
Por Almir Cunha
Você sabe o que é feito na sua cidade pela Secretaria de Esportes? Tem noção da importância social da prática esportiva na vida dos jovens de periferia? Essas e outras dúvidas relacionadas ao mundo esportivo local serão minimamente esclarecidas a seguir.
O artigo 39 do Plano Diretor do Recife deixa bem claro quais são os deveres do governo municipal quando o assunto é esporte. Consolidar a prática esportiva como direito dos cidadãos é um dever do Estado. Isso significa que deve ser cumprido e cobrado pela população. Bem como a criação de políticas sociais e a gerência dos equipamentos públicos que possibilitam a prática dos exercícios físicos. Essas ações são pontos norteadores do plano municipal.
Sabemos bem os benefícios ao exercitar o corpo, gerando aquela sensação de bem-estar na gente. A prática esportiva é recomendação médica e a certeza de que teremos qualidade de vida. Mas será que apenas isso permeia o debate sobre o esporte e suas práticas?
Para se aprofundar no tema, buscamos especialistas da área para traçar um panorama geral. Em meio à crise financeira enfrentada pelo país, como está o andamento na gestão do esporte no Recife?
Para Ângelo Santos, coordenador do Segundo Tempo, um projeto do governo federal, existem políticas públicas na cidade do Recife que proporcionam aos jovens da cidade usufruir de projetos sociais no âmbito esportivo. “A criação no primeiro governo de João Paulo (PT), do Programa Círculos Popular de Esporte e Lazer, que mais tarde veio a fundamentar a elaboração de ações nacionais no âmbito do esporte de participação a partir da criação do Ministério do Esporte, foi para ele um canal de diálogo para os profissionais do esporte”.
Santos ressaltou que a criação da Secretaria de Esporte da Copa do Mundo, implantada na gestão do Prefeito Geraldo Júlio (PSB), possibilitou a ampliação quantitativa e qualitativa dos serviços voltados ao esporte educacional e de participação, através da execução de núcleos esportivos de programas como o Segundo Tempo e o Bom de Bola.
No âmbito do esporte educacional, Ângelo afirma que através de uma parceria com o Ministério dos Esportes, o Recife executa 94 núcleos do Programa Segundo Tempo que estão situados nas escolas municipais da cidade, atendendo no ano de 2016 mais de 12.000 crianças e adolescentes nas seis Regiões Político-Administrativas, conhecidas como RPA´s. Todo esse trabalho é de responsabilidade de uma equipe com 500 pessoas, entre estudantes e profissionais de educação física, contando ainda com os agentes sociais de Esporte e Lazer.
Apesar de comemorar avanços, o coordenador garante que sem intervenção da comunidade quase nada é possível de se concretizar. “Sem participação social nos espaços de decisão e sem vontade política dos nossos representantes, não há política esportiva que se sustente. É só olharmos para o contexto de gestão das nossas entidades, fomentadoras do desporto nacional e observarmos como o mesmo reluz no andamento operacional das ações esportivas desenvolvidas da união.”
O Segundo Tempo tem por objetivo democratizar o acesso à prática e à cultura do Esporte de forma a promover o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens, como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida, prioritariamente em áreas de vulnerabilidade social.
(Fonte: Ministério dos Esportes / Governo Federal)
O professor da Universidade Federal de Pernambuco Vilde Menezes, doutor em Ciência do Desporto pela Universidade do Porto (Portugal) e especialista na área de Gestão de Políticas Públicas do Esporte e do Lazer, avaliou que o esporte dialoga com diversas possibilidades na sociedade, porém, estudos apontam que de 2000 a 2015 os recursos direcionados à área esportiva são oriundos do governo federal. Menezes afirma que os investimentos do governo municipal, são aplicados de forma muito pontual, sem uma perspectiva de universalização de rebatimento ao atendimento do conjunto da população.
Sobre equipamentos públicos, os de maior visibilidade são os Centros Comunitários da Paz (Compaz), sendo a principal vitrine da Secretaria de Esporte e Lazer da Prefeitura do Recife. A cidade dispõe de dois desses equipamentos. O primeiro, localizado na comunidade do Alto Santa Terezinha que foi inaugurado no ano passado e homenageou o ex-governador Eduardo Campos, e o segundo, recém inaugurado no bairro do Cordeiro, Zona Oeste do Recife, batizado com o nome do escritor paraibano, Ariano Suassuna. O objetivo do Compaz é de incluir a juventude das comunidades que estão em um nível elevado de vulnerabilidade social em atividades de informática, robótica, peças teatrais, visando agregar a juventude no mundo contemporâneo.
(Foto: Andréa Rêgo Barros / PCR)
Apesar de considerar uma boa iniciativa, Menezes analisa que boa parte da população recifense não é contemplada com o equipamento. “Claro que proposições como o Compaz são muito bem vindas, mas não dar conta da demanda. Temos que lembrar que a população recifense é de mais de um milhão e meio e que portanto esse quantitativo de aparelhos disponíveis não chega nem perto da demanda que está colocada.”
No âmbito social, a preocupação do professor é de que a negligência dos serviços públicos esteja na ausência de debates e da efetivação de políticas na base, ou seja, nas escolas municipais.
Foto: http://gesporte.blogspot.com.br
“É preciso pensar nas questões que são em tese decorrente da falta de equipamentos públicos de esporte, cultura, lazer, especialmente para periferias, com maior dificuldade de acesso a saneamento básico, a água encanada, escolas, ou seja, na verdade a questão da discussão sobre a política de esporte nas periferias é, também, discutir os problemas das questões como violência. Eu sou daqueles que defende que a discussão sobre políticas públicas, sobretudo, que tenha a população infanto juvenil como protagonista, não pode ser discutida de forma pontual, mas discutir o conjunto das políticas para essa clientela.”
PARTICIPAÇÃO SOCIAL
Pesquisando no site oficial da Prefeitura do Recife sobre participação social, encontramos a aba Conselhos Municipais. Lá, você acha desde o Conselho Municipal de Alimentação Escolar, até o de Combate às Drogas. Sem tirar o mérito de ambos, e apesar de existir o Conselho Municipal de Políticas Públicas para a Juventude, nós não visualizamos o Conselho Municipal de Esportes, ou algo do gênero. Afinal, não é só o jovem que pratica as modalidades esportivas.
INVESTIMENTO NO ESPORTE. A FONTE SECOU?
Na Série: “A fonte secou - E agora?’’ do programa Esporte Espetacular, da Rede Globo, o repórter Marcos Uchoa apresentou dados que afirmam: “98% do dinheiro que sustenta o esporte no Brasil são recursos públicos, verbas do governo federal e passado os grandes eventos como Olimpíadas e Copa do Mundo. No meio de uma crise econômica, o esporte deixou de ser prioridade para quem cuida do orçamento em Brasília.
No primeiro episódio, o olhar sobre menores investimentos nos esportes olímpicos foi retratado aprofundadamente. O pós Olimpíadas trouxe um cenário traumático para os atletas de alto nível. Sem patrocínio, ficaram sem técnico, nutricionista e psicólogo. Resultado: a situação declinou ocasionando não só a queda de rendimento, como no ranking dos melhores do mundo. Com um custo elevado para se manter, os holofotes das Olimpíadas se transformaram em incertezas para os medalhistas brasileiros.
Segundo a série, as principais vias de financiamento desses atletas são: a Lei Agnelo Piva, que dedica 3,2% das rendas das Loterias Federais, dividindo entre o Comitê Olímpico do Brasil, Comitê Paralímpico Brasileiro e a Confederação Brasileira dos Clubes; a Lei de Incentivo ao Esporte, onde o Imposto de Renda das Empresas são direcionados diretamente a projetos esportivos; o Bolsa Atleta e a Bolsa Pódio, que ajudam atletas da elite que tem boa chance de pódio nas competições. Os convênios firmados no Ministério dos Esportes, o patrocínio de empresas estatais como os Correios, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, etc é outra fonte importante, além das Forças Armadas.
Fica claro, portanto, que ainda há muito a ser feito para que se fortaleça o entendimento sobre a importância que as práticas esportivas possuem. O esporte vai muito além, ele muda vidas e a realidade das pessoas.

